fonte : franciscanos.org
“Tudo está interligado” (PAPA FRANCISCO. Carta Encíclica Laudato Si’)
Nós, religiosos franciscanos congregados na Conferência dos Frades Menores do Brasil (CFMB), imbuídos do compromisso com o Evangelho que herdamos de nosso Seráfico Pai, Francisco de Assis, vimos manifestar nosso repúdio e perplexidade diante da clara alusão ao nazismo apresentada em discurso por um integrante do atual governo ao apresentar a proposta de uma iniciativa na área cultural. Para além do fato em si, execrável e sem a menor possibilidade de qualquer justificativa razoável, o que causa preocupação maior é a mentalidade que gera pronunciamentos desta natureza e que, de maneira sutil e sorrateira, vem ganhando força no atual contexto em que vivemos.
Ainda que não haja uma relação direta e comprovada entre tal pronunciamento e fatos graves quem vêm sendo registrados com frequência cada vez maior, parece-nos adquirir força em diferentes ambientes sociais, inclusive religiosos, um discurso de exclusão e domínio que ganha concretude em ações violentas que se tornam cada vez mais comuns em nossos noticiários. Valores como Deus, família, pátria, ordem e segurança, entre muitos outros, têm sido distorcidamente invocados em vista de se construir e manter um sistema seletivo, excludente e avesso à diversidade.
São reiteradas manifestações de desrespeito à vida em sua integralidade, fatos sucessivos que têm disseminado uma atmosfera de ódio e destruição. Nesta profusa seara de sinais de morte, atendo-nos somente em informações mais recentes, testemunhamos a morte por carbonização de dois moradores de rua nas regiões centrais de São Paulo, a disparada no número de assassinato de lideranças indígenas (em 2019, o maior em 11 anos, com 07 casos, segundo o Conselho Indigenista Missionário – CIMI), o aumento do registro de casos de intolerância religiosa, entre outras tantas estatísticas que revelam um perigoso retrocesso que tem ameaçado nossa sociedade.
Como religiosos franciscanos, não podemos fugir à responsabilidade de denunciar o advento de posturas e ações tão contrárias à lógica do Evangelho, esta pautada no diálogo, na acolhida, no respeito, na justiça e na promoção da vida integral. Buscando a fidelidade no seguimento de Jesus Cristo ao modo de Francisco, renovamos nosso compromisso com a justiça e a paz. Conclamamos nossos irmãos e irmãs na fé a nos mantermos firmes na esperança e muito atentos a fim de que, seduzidos por um discurso religioso desencarnado e alheio às dores do mundo, não incorramos na tentação de exaurir nossas forças em posturas autorreferenciais ou na alienação típica daqueles que, de acordo com as denúncias do próprio Jesus, “filtravam o mosquito e deixavam passar o camelo” (cf. Mt 23,24).
Frei César Külkamp,
Presidente
Conferência dos Frades Menores do Brasil – CFMB