A questão sobre a posse de armas de fogo e outros temas atuais: considerações a partir da ótica franciscana
“Mas sejam mansos, pacíficos e modestos, brandos e humildes, falando a todos honestamente, como convém” (Regra Bulada da Ordem dos Frades Menores 3,12).
Estimados irmãos e irmãs, paz e bem!
Diante da repercussão na sociedade do Decreto Presidencial 9685, de 15 de janeiro de 2019, que simplifica e facilita o acesso às armas de fogo para os cidadãos brasileiros, venho, em comunhão com os irmãos da Ordem Franciscana Secular (OFS) no Brasil, que já se pronunciou sobre o tema, em nome dos frades da Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil, da Ordem dos Frades Menores (OFM), manifestar grave preocupação diante dos possíveis efeitos que tal decreto pode produzir e total discordância diante de qualquer direcionamento legal que possa propiciar a difusão e o aumento do uso das armas de fogo pela população. Tal posicionamento brota do compromisso irrenunciável com a promoção da paz e da justiça do qual não podemos nos dispensar se desejamos nos manter fiéis à força medular (2Cel 208) do Evangelho que sustenta a Vida e a Regra de nossa Ordem, fundada por São Francisco de Assis.
Ainda sobre este tema, nossas Constituições Gerais (CCGG) dizem:
“Conscientes também dos atrozes perigos que ameaçam a humanidade, os irmãos denunciem com firmeza toda espécie de ação bélica e a corrida armamentista, que são uma chaga extremamente grave para o mundo e sumamente lesiva aos pobres e não poupem trabalhos e sofrimentos na Construção do Reino do Deus da Paz”. (CCGG, art. 69, par. 2º).
O mesmo texto pede de nós também:
“Quando se encontrarem com os grandes, com os poderosos e com os ricos, os irmãos não os desprezem nem julguem, mas humildemente os admoestem a fazerem penitência também eles e a restituir todos os bens ao Senhor Deus, sempre presente nos pobres. A exemplo de São Francisco, dirijam-se os Frades menores aos homens que ameaçam a vida e a liberdade, para anunciar-lhes a boa-nova da reconciliação e da conversão e a esperança de uma vida nova” (CCGG, art. 98, par. 1º e 2º).
Sendo assim, peço encarecidamente aos confrades e leigos engajados em nossas Frentes de Evangelização que, sem rixas ou polêmicas, atuem como agentes esclarecedores diante desta questão, lançando mão dos elementos de nossa espiritualidade, do Magistério da Igreja, especialmente do Papa Francisco, e também dos numerosos estudos e pesquisas que demonstram não ser este o caminho para a superação da violência, mas, ao contrário, uma forma de disseminá-la ainda mais. Também solicito especial atenção em relação a temas presentes na agenda atual e que digam respeito à retirada de direitos dos povos originários (indígenas), à criminalização de movimentos que trabalham pela justiça social, ao extermínio de jovens pobres e negros, à assunção de projetos pautados na destruição da natureza e de nossa Casa Comum e a outras iniciativas que estejam em dissonância com o Espírito do Evangelho. Em tempos de desafio, a união se faz ainda mais necessária.
Em relação aos agentes da lei, apelo para a consciência da responsabilidade que exercem e do compromisso democrático que assumiram com a promoção do bem comum, objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, conforme versa inciso 4º, art. 3º de nossa Constituição: “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Trago em minhas orações nossa pátria e nação, assim como o povo brasileiro, para que, juntos, tenhamos a ousadia e o compromisso de construirmos um país sem ódio, sem violência, sem morte, sem armas.
Com estima fraterna,
São Paulo, 22 de janeiro de 2019.
Frei César Külkamp, OFM
Ministro Provincial
Fonte : Franciscanos .org