SOLENIDADE DA ASCENSÃO DO SENHOR
13/05/2018
Pistas homilético-franciscanas
Leituras: At 1,1-11; Sl 46 (47); Ef 1,17-23; Mc 16,15-20
Tema-mensagem: Terminada a missão que o Pai lhe confiara aqui na terra, Jesus a entrega aos discípulos e, elevando-se, retorna para junto do Pai
Sentimento: admiração e esperança
Introdução
O mistério da Ascensão do Senhor, que celebramos neste Domingo, não podia ser melhor resumido do que pelo canto do Prefácio da missa de hoje: “Jesus, o Rei da Glória, nossa cabeça e princípio, subiu hoje, ante os anjos maravilhados, ao mais alto dos céus, não para afastar-se de nossa humanidade, mas para dar-nos a certeza de que nos conduzirá à glória da imortalidade”.
- Jesus prepara sua partida
Quem, dentre os textos do Novo Testamento, mais detalhadamente descreve o evento da Ascensão é a primeira leitura da Missa de hoje, tirada do primeiro capítulo dos Atos. Duas partes formam esta narrativa. Na primeira, a mais longa (verso 1-9), temos o discurso de despedida de Jesus com suas últimas instruções aos seus discípulos e, na segunda, a descrição de sua ascensão.
- Os últimos anúncios
O autor começa falando do ministério que Jesus desenvolveu junto aos seus discípulos durante o período dos quarenta dias que se seguiram à sua Ressurreição. Estamos de novo, diante do misterioso número 40. Quarenta dias ou anos, é sempre o tempo de Deus, isto é, de sua ação ou obra nas gerações humanas. Assim, os quarenta dias da Ressurreição até a ascensão é o tempo em que Jesus, animado pelo poder de Deus, através de inúmeras aparições e reencontros vai fortalecendo a fé dos discípulos na pessoa Dele e na sua obra que logo em seguida eles deverão levar adiante.
- Permaneçam em Jerusalém
Lucas, recorda que “durante uma refeição” – Última Ceia – Jesus havia ordenado a seus discípulos que não se afastassem de Jerusalém…” (Cf. Lc 1,4). A razão desta ordem é muito simples: a expansão do evangelho, a obra da evangelização deve nascer lá onde tudo se consumou: o mistério da Crucificação e ressurreição que se deu em Jerusalém. Assim, tudo vai realizar-se segundo a promessa de Jesus: “Sereis minhas testemunhas em Jerusalém… até os confins de toda a terra” (At 1,8). Eis pois porque, segundo Lucas, a evangelização deve começar em Jerusalém, expandir-se progressivamente pelo mundo dos gentios até, com a pregação de Paulo, chegar a Roma, capital do mundo de então.
1.1.2. Sereis batizados no Espírito Santo
O segundo anúncio, é sem dúvida, o mais importante de todos: “Esperai a realização da promessa do Pai… vós sereis batizados com o Espírito Santo, dentro de poucos dias” (v. 4-5).
Os quarenta dias de presença e assistência de Jesus Cristo ressuscitado junto aos Apóstolos e a comunidade originária dos discípulos fecham os anos de sua missão aqui na terra e abrem os anos da missão da Igreja – a assembleia dos eleitos – a serviço do Reino do Pai. Este fora o grande e único tema de suas conversas durante aqueles quarenta dias de suas aparições.
A compreensão dos discípulos, porém, a respeito do Reino de Deus, a serviço do qual eles serão enviados, era ainda muito estreita, como o demonstra esta pergunta: “Senhor, será que é agora o tempo em que vais restabelecer o Reino para Israel?” Eles esperavam, ainda, uma iminente restauração política do Reino de Israel. Escapava-lhes o sentido escatológico e universal do Reinado de Deus.
Por isso, com sua resposta, Jesus procura, em primeiro lugar, ampliar-lhes a visão acerca da história. A partir de sua morte e ressurreição, a história não pertence mais aos homens, mas a Deus; a história não está mais nas mãos da inteligência e do poder dos homens, com seus projetos e planejamentos, mas nas mãos da regência do “não-poder” da cruz e ressurreição Dele, isto é, na misericórdia e perdão do Pai.
Em segundo lugar, a resposta de Jesus amplia a visão dos discípulos acerca do espaço do Reino de Deus. Esse espaço não é mais só e unicamente o território e o povo de Israel. Ele é ecumênico, isto é, abrange todos os povos, pois a Alegre Mensagem (Evangelho) é universal: é para toda a criação. A Jovialidade de Cristo crucificado – a Perfeita Alegria – em vez de particularidade de um grupo humano é um dom que é oferecido e comunicado a todos os humanos, de todos os povos e nações.
- Jesus foi levado ao céu.
Terminado o discurso de despedida com suas recomendações “Jesus foi levado para o céu à vista deles e sentou-se à direita de Deus” (v. 9).
Estamos diante do momento mais significativo e importante de toda a história, pois de nada teria adiantado tudo o que Deus já realizara no passado, de nada teria valido ter-nos entregue seu Filho até a morte e morte de cruz, de nada teria valido sua ressurreição se este seu Filho humanado não tivesse retornado à direita do Pai. Seríamos ainda filhos perdidos, prisioneiros do Maligno, longe, banidos da Casa do Pai, um Povo sem pátria e sem Rei.
Assim, a culminância do destino de toda humanidade, de toda a sua história e de toda a criação se dá na culminância do destino de Jesus com sua reentrada na glória de Deus, na comunhão com o Pai, que o enviara. Este retorno é misterioso. Por isso, ele se dá envolto por uma nuvem. A nuvem, simultaneamente, esconde e manifesta. Diz presença e ausência, ao mesmo tempo. O céu e a terra, o divino e o humano, agora que nossa carne subiu ao céu no corpo exaltado de Jesus Cristo ressuscitado, são um.
Assim, como nosso precursor, Ele prepara o caminho de nosso arrebatamento para junto do Pai. No corpo de Jesus elevado ao céu, sentado “à direita de Deus”, isto é, entronizado no Reino do Pai, se dá a maior exaltação da nossa natureza humilde, baixa, terrena, finita. Com Ele, nossa natureza é elevada acima dos céus, isto é, das virtudes celestes (anjos). Que o ser humano, em corpo e alma, seja tão exaltado, é motivo de grande admiração e alegria. São João Crisóstomo diz: “teu corpo será igualmente levado aos céus, porque o teu corpo é da mesma natureza que o corpo de Jesus Cristo”.
A Ascensão de Cristo consuma assim, o mistério da encarnação. Segundo Santo Agostinho, para Jesus Cristo, “ir para o Pai e distanciar-se de nós significava mudar em imortal quanto de mortal Ele tinha assumido de nós, e elevar ao mais alto do céu a natureza terrena da qual, por nós, Ele tinha se revestido”. São Cirilo de Alexandria, diz que, com sua Ascensão, Cristo inaugura um caminho novo e vivo, um caminho que antes era intransitável, isto é, o caminho que dá acesso ao céu, ou melhor, ao Santuário Celeste, como diz a Epístola aos Hebreus (Cf. Hb 9, 24). Os Padres da Igreja, por sua vez, gostam de meditar no espanto dos anjos, ao verem algo de tão extraordinário: um homem, um mortal, ascender às esferas celestiais, e sentar-se à direita de Deus Pai.
Vem então o anúncio final de toda esta narrativa: “Apareceram dois homens de vestes brancas que lhes disseram: ‘Homens da Galileia, porque ficais aqui parados, olhando para o céu? Este Jesus, que vos foi arrebatado para o céu, há de vir do mesmo modo como o vistes partir” (At 1, 11).
Duas considerações merecem nossa atenção. Primeiramente, os dois homens de branco (seria o espírito do Antigo e do Novo Testamentos?), os anjos, mensageiros da Jovialidade divina, estão despertando a consciência dos discípulos acerca de sua hora, de sua vez. Competia a eles, agora, levar até os confins do universo e até o fim dos tempos, tudo o que eles tinham visto e ouvido.
Em segundo lugar, esse Jesus Cristo que foi arrebatado ao céu e que foi entronizado junto ao Pai consumará a história com sua segunda vinda (parusia). Sua vinda, menos que uma “volta”, será a manifestação da sua presença. Ele está no meio de nós, em meio às vicissitudes da história, numa presença latente, numa vigência velada. Confiar no mistério desta presença velada, saber que, ao subir para o céu, Ele não nos abandonou, mas que Ele está conosco todos os dias, até a consumação dos tempos e o cumprimento de todos os momentos, isto é fonte de alegria e de jovialidade para todos nós, seus discípulos. Sua volta ao Pai é uma nova forma de estar junto de nós e de nos acompanhar na missão que nos entregou.
- Jesus Cristo e sua sumidade
A segunda leitura é tirada do primeiro capítulo da Carta de São Paulo aos Efésios. Na primeira parte (1,3-14) deste capítulo, numa espécie de introdução, encontramos um dos mais belos e profundos hinos de louvor e de ação de graças a Deus Pai por causa da origem da Igreja: “Bendito seja Deus, o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo que nos céus nos abençoou com toda a bênção espiritual em Cristo. Ele nos escolheu em Cristo antes da constituição do mundo para sermos santos e irrepreensíveis diante Dele no amor…” (Ef 1,3-4).
Estamos aqui, diante da fonte mais profunda, última e primeira da Igreja: o dom da eleição gratuita de Deus. Por isso, para Paulo, a Igreja é anterior ao cristianismo, anterior à sua constituição como comunidade eclesial.
2.1. Um espírito de sabedoria.
Agora, dando continuidade a este hino eclesial, na segunda leitura de hoje, Paulo não podia fazer outra coisa senão rogar ao Pai para que dê aos discípulos de Éfeso o “espírito da sabedoria” (pneuma sophías). Quando Paulo fala em Espírito está se referindo aquele vigor, àquela alegria e iluminação ou luz que nascem da graça do encontro com Jesus Cristo e que se tornam fonte de inspiração, sopro de vida. Desta luz ou inspiração do Espirito advém aos discípulos a Sabedoria. Mais adiante, o próprio Paulo esclarece que a luz, o sopro de vida, a sabedoria que ele está implorando para eles não é outra senão a força de Deus manifestada em Cristo ressuscitado (Cf. Ef 1,20). Desta sabedoria provém o conhecimento. A palavra usada por Paulo na Carta aos Efésios, na leitura de hoje, é “epignosis”, uma palavra grega que indica um modo de conhecer como quem vê “sobre”, isto é do alto; um ver que, por isso, penetra fundo, até o íntimo, o coração da pessoa; um ver ou conhecer que percebe, descobre, compreende e re-conhece por dentro a verdade mais verdadeira da pessoa. Paulo roga, portanto, que o dom da iluminação (photismós), da glória que nasce do encontro com Cristo crucificado-ressuscitado se revele, se manifeste e tome conta dos discípulos de Éfeso. Trata-se, pois, de uma iluminação cordial, isto é, do coração, o centro, o âmago, do nosso ser, em que se dá a sensibilidade mais profunda do nosso espírito.
2.2. Fé e esperança que nascem do chamado
Paulo, então, começa a elencar os benefícios para quem é atingido por esta visão, esta sabedoria, esta luz:
– O primeiro é a esperança: “para que saibais qual a esperança da vocação que o seu chamamento vos dá…”. Ora, como poderia não esperar, ou desesperar, alguém que tenha visto e tocado no seu Senhor, um Senhor que, por ele e para, o servo, tenha dado sua vida?!;
– O segundo é a glória: “para que saibais qual a riqueza da glória que está na vossa herança com os santos…”. Glória é o brilho, o fulgor, a força que se revela como fruto da busca da própria identidade. Por isso, se fala em glória de um médico, agricultor, etc. Aqui. Se trata da glória dos santos, isto é, daqueles que testemunharam Jesus Cristo, seguindo seus passos até a Cruz. Eis nossa herança, diz Paulo, aos efésios, reservada a eles e a todos os seguidores de Jesus Cristo;
– Finalmente, o poder: “e que imenso poder Ele exerceu em favor de nós…”. Ora, qual o poder que Deus pôs em nosso favor, senão o poder com o qual revestiu seu Filho de ser o vencedor da morte e do pecado, ou seja, o poder de como Ele estarmos sentados à sua direita junto do trono da misericórdia e do Perdão.
- Do mandato missionário e da ascensão do Senhor
A dinâmica do evangelho de hoje, vem estruturada assim: primeiramente nos encontramos com o mandato missionário e depois com a Ascensão do Senhor
3.1. Do mandato missionário
É admirável como o evangelista inicia a narrativa da Ascensão: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai o Evangelho a toda a criatura”. Nunca se viu um mandato tão simples, breve e ao mesmo tempo tão denso, rico, profundo e amplo. O mandato começa com um solene “ide” aos discípulos todos, os de ontem, de hoje e de sempre.
Aí está a identidade de todo cristão. Somos, como gosta de falar nosso Papa, “chamados-enviados”. Não existe um sem o outro. É impossível ser chamado sem ser enviado como não é possível ser enviado sem ser chamado. Chamado e resposta andam tão juntos quanto o verso e reverso de uma única e mesma moeda. Isto porque na origem deste mistério está a graça do encontro com Jesus Cristo. Na verdade, Jesus não chama os discípulos para tê-los egoisticamente junto de si para sua própria satisfação. Além do mais, Ele estava imbuído do mesmo espírito do Pai que é sempre um “Deus em saída” (Papa Francisco). Por isso, Ele não podia, naquela sua despedida, proclamar outro mandato senão este: “Ide, anunciai o Evangelho a toda a criatura”.
Fica claro, também e em segundo lugar, que o mandato é para todos os discípulos. Acabou o tempo em que se considerava ou pensava que o chamado e o envio na Igreja era responsabilidade e honra apenas para alguns privilegiados, os clérigos. Quem compreendeu bem que esse mandato é para todos os batizados foi São Francisco. Logo após ter ouvido o evangelho do Envio dos Apóstolos, ele, que era um simples leigo, começou a percorrer aldeias e povoados, anunciando a todos a perfeição evangélica e a pregar a penitência (Cf. LTC 25). Além do mais, chegou a escrever um capítulo na Regra destinado a orientar como, também os frades leigos e iletrados, podiam exortar os fiéis ao temor de Deus e à adoração do Pai e do Filho e do Espírito Santo (Cf. RNB 21).
Finalmente, devemos recordar que no coração do mandato missionário está o anúncio do Evangelho. E, quando se diz Evangelho, a exemplo dos primeiros cristãos e de São Francisco, não se trata apenas de um livro, de uma doutrina, um ideal, mas da própria Pessoa de Jesus Cristo com sua obra, principalmente com sua Encarnação, Paixão, Morte e Ressurreição. Por isso, lamenta nosso Papa quando, segundo ele, há pregadores, padres e bispos que gastam o precioso tempo da pregação falando mais da Igreja, da organização, das obras, da teologia, da moral, do pecado e até mesmo do Papa do que de Jesus Cristo” (Cf. EG 38).
Segue então o anúncio do sentido último de toda a evangelização: a fé e o batismo: “Quem crer e for batizado será salvo. Quem não for será condenado”. Primeiramente, porém não podemos confundir fé com crença. A fé cristã, é a alegria, o vigor, o entusiasmo que nasce e floresce da experiência de ser acolhido, aceito e amado pelo Deus de Jesus Cristo. É acolher, humilde, alegremente e com profunda gratidão, que se é aceito e amado mesmo sendo inaceitável e infiel. E quando isso acontece a fé sempre se constitui ou se transforma em novo nascimento, batismo. Em nosso caso, o batismo significa ser mergulhado para dentro do “nome”, isto é, do vigor do Pai e do Filho e do Espírito Santo, o mistério originário, fontal e insondável da vida. Por isso, esses estão salvos, isto é, estão com a saúde originária, o que não acontece com aqueles que, com sua obstinação, se fecham a esta mensagem preferindo viver mergulhados na tristeza individualista do que na Boa Nova de Cristo.
3.2. Os sinais
A seguir Jesus fala dos “sinais que acompanharão aqueles que crerem Nele”. Em primeiro lugar eles expulsarão demônios. Ora, que seriam esses demônios senão as potências anímicas e espirituais que tolhem do homem a liberdade, os “espíritos do engano”, que seduzem os homens para os vícios. Alguns destes demônios, hoje, vêm muito bem elencados pelo Papa Francisco na Evangelii Gaudium e no famoso discurso aos Cardeais, quando fala dos “vícios curiais”:
– “a busca da glória humana e do bem-estar pessoal”;
– “a ânsia de “dominar o espaço da Igreja”;
– “o fascínio pelo poder” (EG 93-95);
– “sentir-se imortal”, “imune” ou até mesmo “indispensável”;
– “a rivalidade, a soberba, a vanglória, a divinização dos chefes”, etc. (Cf. Cristãos leigos e leigas na Igreja e na sociedade, Doc. CNBB, 105, 48).
Todos esses demônios fogem quando o cristão, de fato segue, mergulha no poder de Cristo e de seu Evangelho.
Um segundo sinal, diz Jesus, “Falarão línguas novas”. Santo Antônio elucida o dito dizendo que os verdadeiros evangelizadores testemunharão a Jesus Cristo com as obras novas dos homens novos, nele renascidos. Ele mesmo enumera algumas dessas obras: a humildade, a pobreza, a paciência e a obediência (Cf. Sermão de Santo Antônio em Ofício das Leituras, 13 de junho).
Outro sinal, diz Jesus: “Pegarão serpentes com a mão”, ou seja, não irão sucumbir frente à astuta e vã ciência dos homens, face à sabedoria mundana e carnal deles. Não serão intoxicados pelos venenos dos vícios humanos. Ao contrário, comunicarão a saúde, isto é, o vigor da vida que brota de Cristo como de sua fonte, a todos os enfermos: “imporão as mãos a doentes e estes serão curados”. São Gregório Magno tem um belo ensinamento acerca deste sinal:
Quando os sacerdotes impõem as mãos sobre os crentes e, com a graça que lhes é dada de exorcizar, se opõem à permanência do espírito maligno no coração daqueles, não fazem outra coisa do que expulsar deles os demônios. E o fiel que abandona o espírito mundano e canta os santos mistérios, falará novas línguas; dominará as serpentes, se com suas exortações tirar a malícia do coração de seu próximo; beberá licor venenoso e não lhe fará dano, se ouve conselhos maus e não se deixa levar por eles; porá, enfim, as mãos sobre os enfermos, e estes ficarão curados, todas as vezes que, vendo vacilar o seu próximo no caminho do bem, o fortifica com o exemplo das boas obras. E seus milagres, são tanto maiores, quanto são espirituais, e quanto mais por eles despertam do sono não os corpos, mas as almas.
3.2. A ascensão e seus benefícios
A narrativa do mistério da Ascensão conclui: “Então, o Senhor Jesus, depois de lhes ter falado, foi arrebatado ao céu e sentou-se à direita de Deus”. Santo Agostinho nota que, em latim, estar sentado significa o mesmo que habitar. Ora, habitar significa ocupar espaço, cuidar e cultivar o lugar o ambiente sobre o qual a pessoa se estabelece. Segundo esta interpretação, podemos dizer que Jesus Cristo está assentado na morada do Pai, que ele habita junto à fonte, ao princípio da deidade, na bem-aventurança não para deleite e encanto próprio, mas para continuar a obra do cultivo do humano de todos os homens a fim de que todos cheguem à unidade da fé, e ao conhecimento Dele como Filho de Deus e assim se tornarem homens perfeitos, até alcançarem a estatura completa Dele mesmo (Cf. Ef 4,13). Por isso, a grande conclusão de todo o Evangelho de Marcos: “O Senhor ajudava os discípulos e confirmava sua palavra por meio dos sinais que a acompanhavam”. (v. 30).
Conclusão
O mandato missionário de Jesus por ocasião de sua Ascensão desperta em todos os seus discípulos sempre de novo duas importantes questões: a universalidade da missão do cristianismo e da Igreja e o caráter missionário de todos os batizados.
Ora, assim como outrora os discípulos de Jesus tinham imensa dificuldade de abrir-se à compreensão católica (universal) da fé, também hoje nós apresentamos a mesma dificuldade. Sem a pobreza que se abre ao Espírito Santo, a Igreja de Cristo se divide, se quebra e se espatifa em milhares de seitas, e, ali onde ela se quer ainda como católica, ela corre o risco de não conseguir ser de fato o que ela é de nome, ou ainda corre o risco de entender mal esta universalidade… O título “Igreja Universal”, então, passa a ser um triste arremedo, uma caricatura extremamente desfigurada, da catolicidade da Igreja.
A universalidade do mandato missionário de Jesus nos faz lembrar que o mundo, como nos lembra São Francisco, é o primeiro lugar da presença e da missão da Igreja, isto é de todos os batizados, principalmente dos leigos e leigas. Todavia, percebe-se que é ainda muito forte a “tendência de valorizar, exclusivamente ou quase, a evangelização no interior da Igreja” (Cristãos Leigos e Leigas na Igreja e na sociedade, 40) e dos ministros sagrados. Consequentemente, e por isso, segundo o mesmo documento, constata-se que “é ainda insuficiente e até omissa a sua ação evangelizadora nas estruturas e realidades do mundo, nos areópagos da universidade, da comunicação, da empresa, do trabalho, da polícia, da cultura, da medicina, do judiciário e outros” (Idem, 39).
Hoje, a igreja, depois de alguns séculos de esquecimento está despertando de novo para esta sua dimensão missionária. Por isso diz nosso Papa: “Cada cristão e cada comunidade há de discernir qual é o caminho que o Senhor lhe pede, mas todos somos convidados a aceitar este chamado: sair da própria comodidade e ter a coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho” (EG 20).
Fraternalmente,
Marcos Aurélio Fernandes e Frei Dorvalino Fassini