“Inspirem-se para poder inspirar os outros”, pede Ministro geral da OFS

Ministro Geral Tibor Kauser

“Inspirem-se para poder inspirar os outros”, pede Ministro.

Por ocasião dos 40 anos da Regra da Ordem Franciscana Secular (OFS), o Ministro Geral, Tibor Kauser, enviou uma mensagem aos membros da OFS e da Jufra, exortando-os a viverem o carisma franciscano com alegria. “A nossa Regra, que é verdadeiramente franciscana, ajuda-nos a descobrir como viver a nossa vocação cada dia, como deve ser a nossa vida cotidiana. Não somos ‘franciscanos dominicais’ nem ‘franciscanos da tarde’. A Regra deve inspirar-nos a cada momento da nossa vida, para nos converter num comportamento e como uma rotina”, afirma o Ministro Geral.

Confira na íntegra:

A todos os irmãos e irmãs da OFS, A todos os membros da Jufra do mundo,

Queridas irmãs e queridos irmãos! Que o Senhor vos dê a Sua paz!

Este ano celebramos o 40º aniversário da Regra da Ordem Franciscana Secular, aprovada pelo Beato Papa Paulo VI a 24 de junho de 1978, com a sua carta “Seraphicus Patriarcha”. Este é o momento adequado para nos perguntarmos: O que é a Regra para mim na minha vida pessoal? O que é a Regra para nós, como Fraternidade internacional, a todos os níveis? O que significa para nós “celebrar este aniversário”, celebrar a Regra?

A Regra é um preceito de vida para nós, franciscanos seculares, mas também é um documento  de grande inspiração para os membros da Jufra, se quiserem seguir a Cristo seguindo os passos de São Francisco. Então, envio esta carta não só às irmãs e aos irmãos da Ordem Franciscana Secular, mas também aos jovens irmãos e irmãs da Jufra. Permitam-me começar com uma reflexão pessoal: para mim, a Regra é um presente, um chamamento, uma inspiração e um instrumento.

Um presente

Em primeiro lugar, a Regra da Ordem Franciscana Secular é um tesouro, um presente de Deus, que mostra quão grande é o amor de Deus e da Igreja pela Ordem Franciscana Secular. É algo que não se pode comprar nem merecer. Como nos disse S. João Paulo II: “é um verdadeiro tesouro nas vossas mãos, está de acordo com o espírito do Concílio Vaticano II e responde ao que a Igreja espera de vós”[1]. Por isso, temos que dar graças por este dom, dar graças a Deus e à Igreja.

Como qualquer presente, isto também, de uma maneira ou de outra, traz a marca de quem o deu, mostrando-nos como Deus quer que vivamos uma vida bela e rica. Cada artigo da Regra reflete a riqueza infinita de Deus, é como uma joia que ressalta os diferentes aspetos da nossa identidade e da nossa vida. Agora que celebramos o 40º aniversário da nossa Regra, devemos recordar que não celebramos o presente em si mesmo, mas aquele que no-lo deu, que é Deus. Portanto, vivamos esta celebração com um coração que dá graças a Deus e demos-lhe graças com a nossa oração, o nosso amor, toda a nossa vida.

Um chamamento, um convite

“O Senhor continua ainda a chamar para viver com Ele e segui-Lo numa particular relação de proximidade ao seu serviço direto. E, se fizer intuir que nos chama a consagrar-nos totalmente ao seu Reino, não devemos ter medo. É belo – e uma graça grande – estar inteiramente e para sempre consagrados a Deus e ao serviço dos irmãos!”[2]

Este chamamento reflete-se na Regra, e devemos responder a este chamamento com generosidade, sem medo. Deus chama-nos como somos. Somos imperfeitos e débeis, mas não importa, não devemos ser surdos nem cegos! Sabemos como “o glorioso confessor de Cristo, S. Francisco, fundador desta Ordem, mostrando ao mesmo tempo com a palavra e o exemplo o caminho para aceder ao Senhor, educou os seus filhos sobre a sinceridade desta mesma fé e lhes ordenou que a professassem, que a mantivessem sempre firme e que a expressassem com as obras, para que, caminhando de maneira saudável pelas suas sendas, mereçam a felicidade eterna no final da peregrinação terrenal”.[3]

Este chamamento de Deus foi inserido na nossa Regra: “sejam possuidores da bem-aventurança eterna”, sejam Santos! Vivam de uma maneira que vos leve à santidade! Observem a Regra que vos ajuda a seguir a Cristo em cada momento e aspecto da vossa vida! “A dignidade dos leigos fiéis revela-se plenamente se se considera a vocação primeira e fundamental, que o Pai em Jesus Cristo mediante o Espírito Santo pede a cada um deles: a vocação à santidade, ou seja, a perfeição do amor… É mais urgente hoje que todos os cristãos retomem o caminho da renovação evangélica, acolhendo generosamente o convite apostólico que ‘sejam santos em toda a conduta’ (1 Pd 1,15). A vocação dos leigos fiéis à santidade implica que a vida, segundo o Espírito, se expresse de uma maneira particular na sua inserção nas realidades temporais e na sua participação nas atividades terrenas”[4]… Este chamamento à santidade requer uma resposta afirmativa. O chamamento verdadeiro de Deus requer a nossa resposta verdadeira e positiva. Sejamos aqueles que transmitem este chamamento de Deus aos demais, chamemos os demais até Deus, para que “recordem o nosso convite em bom tempo, e quantos mais poderiam adquirir a santidade cristã”.[5]

Um documento inspirador

A nossa Regra não é só um texto normativo ou legislativo, mas também (e sobretudo) um texto espiritual. Deve-se ler muitas vezes, não só porque temos que manter as normas ou recitar as orações já escritas, mas também e sobretudo porque é o nosso tesouro, que nos ajuda a realizar a nossa vocação. Deve inspirar-nos! Nós, franciscanos seculares, temos tudo na nossa Regra que pode dar-nos a inspiração necessária para percorrer o caminho da nossa viagem vocacional.

Celebrar a nossa Regra é fazê-la viver, só assim seremos fiéis à proposta de Jesus, que nos convida a amar-nos como irmãos. Francisco de Assis deu-nos o exemplo da graça da conversão como um grande presente que nos compromete a seguir o caminho franciscano com coragem e amor. A nossa Regra, que é verdadeiramente franciscana, ajuda-nos a descobrir como viver a nossa vocação cada dia, como deve ser a nossa vida cotidiana. Não somos “franciscanos dominicais” nem “franciscanos da tarde”. A Regra deve inspirar-nos a cada momento da nossa vida, para nos converter-num comportamento e como uma rotina.

Dado que os irmãos e irmãs religiosos usam um hábito, nós também devemos ter um hábito, que nos caracteriza, que nos faz visíveis e reconhecíveis. Mas este vestido não é visível. Não temos um vestido feito à medida. O nosso comportamento, a maneira que vivemos a nossa vida na família, na Igreja, na fraternidade, no trabalho ou durante o tempo livre, deve ser o nosso hábito. O nosso hábito deve ser a nossa bondade, o nosso amor visível a Deus e aos demais, a nossa disposição a servir, a nossa forma de vida simples, a nossa liberdade verdadeira como filhos de Deus. O nosso hábito deve ser a nossa oração, a nossa vida sacramental, o nosso compromisso com a Ordem e com a fraternidade. O nosso hábito é a nossa forma de vida franciscana, que vivemos “do Evangelho para a vida e da vida para o Evangelho”.[6]

A vida de um franciscano secular não é uma vida uniforme. Somos diferentes. Temos que levantar a cabeça, abrir os olhos e olhar ao nosso redor: que bela e rica é esta vida que Deus nos oferece para viver de acordo com a nossa vocação! Convido-vos a todos a que descubram os seus talentos e que se inspirem na Regra como se deve viver a sua vida diária. Descubramos a riqueza de Deus, a riqueza da nossa vocação! Alguns de nós sentimo-nos mais próximos de uns artigos da Regra do que de outros; enquanto outros nos sentimos mais próximos a outros artigos.

Para alguns de nós, alguns artigos parecem ser mais fáceis de viver do que outros. Sim, a Regra não quer conformar-nos, mas unir-nos dentro da diversidade. Saiam fora e descubram como podem viver a vossa vocação na Igreja, na sociedade, no meio dos pobres, dos necessitados, com aqueles que mais queremos na família, no trabalho, na fraternidade, durante o tempo livre, de diferentes maneiras refletindo sobre o mesmo carisma e a mesma vocação. Inspirem-se para poder inspirar os outros!

Um instrumento que ajuda para a vida cotidiana

A Regra é um texto sem sentido se não a transpomos para a vida. Temos que usá-la. “Ser discípulo significa ter a disposição permanente de levar o amor de Jesus aos demais e isto ocorre espontaneamente em qualquer lugar, no caminho, na praça, no trabalho, numa rua”[7].

Certamente, a Regra tem regulações muito concretas, porque enfrentamos situações muito reais na nossa vida diária, assim podemos viajar pelo caminho correto. “A Igreja oferece-a como uma norma de vida”[8].

Em inglês, a palavra regra (rule) é a raiz da palavra régua (ruler), uma ferramenta para estudantes, professores, engenheiros, arquitetos e desenhadores. Deixem-me dar-lhes um exemplo: a regra é como uma régua, podem desenhar uma linha reta só com ela. Mas o objetivo não é desenhar uma linha reta. O objetivo é ter um desenho, um plano de uma casa, que se irá construir e será um lugar para alguém.

A Regra não é um objetivo em si mesmo. Sabendo isto, o objetivo não é a aplicação ao detalhe dos seus artigos. Pelo contrário, o objetivo é chegar a ser santos, mostrar o amor de Deus ao mundo, melhorar a vida dos demais, aproximar-se de Deus e aproximar os outros de Deus. A Regra é como uma régua, um instrumento para nós, que nos ajuda a ser santos, que nos ajuda a manter a linha reta, inclusive quando temos dificuldades na vida, quando perdemos a direção do nosso olhar. Neste sentido, a regra é um instrumento. É algo que está sempre à mão, onde sempre podemos recorrer.

As palavras da Regra devem pôr-se em prática e a nossa prática deve ser verificada e avaliada à luz da Regra. Devemos usá-la, lê-la muitas vezes e com cuidado, falar dela entre nós e com os outros, viver de acordo com os seus valores, “porque os valores que contêm são eminentemente evangélicos”. [9] E da mesma maneira, também devemos ser boas ferramentas nas mãos de Deus. Devemos estar disponíveis para que Deus nos use como instrumentos, instrumentos da paz, da alegria e do amor de Deus.

Beleza e alegria

Como um manancial num bosque verde, uma nova vida sempre brota da Regra. Foi assim pelos séculos. Contudo, os anos passam e o carisma franciscano continua a ser o mesmo. Continua a ser válido e deve viver-se mais do que nunca. Como escreveu o Beato Papa Paulo VI: “Estamos felizes de que o ‘Carisma Franciscano’ seja hoje uma fortaleza para o bem da Igreja e da comunidade humana, apesar da infiltração das doutrinas e das tendências que afastam as pessoas de Deus e do sobrenatural. Com uma iniciativa digna de elogio e de comum acordo, as quatro famílias franciscanas trabalharam durante dez anos para preparar uma nova Regra para a Terceira Ordem Franciscana Secular, ou como se chama agora, a Ordem Franciscana Secular. Isto foi necessário devido às condições dos tempos que mudaram e dos ensinamentos e ânimo que lhes deu o Concílio Vaticano II”.[10]

Passaram mais de 800 anos, mas a beleza e a alegria da vida franciscana são sempre as mesmas. Passaram 40 anos destas frases do Papa Paulo VI, mas a beleza e a alegria da Regra não desvaneceram. Podemos falar da beleza porque a vida, à qual somos chamados e inspirados pela Regra, é bela. Todos os aspectos – a oração, a contemplação, a leitura do Evangelho, a vida familiar, o trabalho e muitos outros – refletem a beleza da vida inspirada por Deus e vivida por São Francisco, dando-nos um exemplo. E também podemos falar da alegria, porque as virtudes da Regra, como a simplicidade, a obediência, a justiça, o espírito fraterno, dão-nos uma vida alegre. Ao colocarmos estas virtudes nas nossas ações diariamente, experimentaremos a alegria do Evangelho.

A Regra será uma fonte que refrescará a vida nas nossas fraternidades, que também têm um papel “para abrir nelas como um ginásio, onde se exercita a vida cristã com maior diligência”.[11] Estas fraternidades são um lar e um lugar “para estudar, amar e viver a Regra”.[12] Viver a nossa vocação e cumprir o nosso chamamento missionário de irmos para o mundo podem ser animados experimentando a beleza e a alegria da nossa vocação, que se refletem na nossa Regra, e devemos partilhar esta beleza e esta alegria. Convido-vos e alento-vos a todos vós: saiam e partilhem esta beleza e alegria! A mensagem cristã autêntica não provém dos livros. Vai de pessoa para pessoa. O vosso testemunho, o nosso testemunho, é essencial para a renovação da nossa Ordem e de toda a Igreja. Cada vez que lemos a Regra e decidimos viver ou agir em consequência (desta), damos um passo em frente para realizar esta vocação e esta missão.

1] Discurso de S. João Paulo II aos membros do Capítulo Geral da OFS, 27 de setembro de 1982.

[2] Mensagem do Papa Francisco para a 55ª Jornada Mundial de oração pelas vocações 2018.

[3] Supra Montem, Papa Nicolau IV, 18 de agosto de 1289.

[4] Chritifideles Laici 16-17.

[5] Misericors Dei Filius, Papa Leão XIII, 30 de maio de 1883.

[6] Regra OFS 4.

[7] Evangelii Gaudium 127.

[8] Carta dos Quatro Ministros gerais por ocasião da aprovação da Regra

[9] Discurso de S. João Paulo II aos membros do Capítulo Geral da OFS, 27 de setembro de 1982.

[10] Seraphicus Patriarcha, Papa Paulo VI, 24 de junho de 1978.

[11] Misericors Dei Filius, Papa Leão XIII, 30 de maio de 1883.

[12] Discurso de S. João Paulo II aos membros do Capítulo Geral da OFS, 27 de setembro de 1982.

[13] Regra OFS 19.

[14] Regra OFS 7.

[15] RNB XXIV.

fonte: Franciscanos.org.br