Santa Clara
e a opção pela pobreza
Certamente não foi fácil para Clara vencer as barreiras que haviam entre ela e a vida evangélica que Francisco lhe propunha: abandonar o luxo e o conforto, para viver na pobreza como Jesus Cristo era uma decisão muito difícil; mas segundo ela mesma relata em seu testamento, seu relacionamento com Francisco faz parte da misericórdia de Deus na qual o momento da vocação é um momento privilegiado.
A vida religiosa confere algo de sagrado a quem a abraça. Aquilo que parece loucura ao povo comum toma aspecto de santidade para as almas nas quais Deus vive. É assim que, vivendo no claustro e afastada do mundo, Clara conquista fronteiras e muitas nobres abandonam o luxo e a riqueza para viverem como ela o amor ao Cristo pobre e crucificado.
Contempla Jesus e seu mistério salvífico e revela isso nas cartas a Inês de Praga: “Ponha a mente no espelho da eternidade, coloque a alma no esplendor da glória. Ponha o coração na figura da substância divina e transforme-se inteira pela contemplação, na imagem da divindade (3 Ctln 12-13. F.C.).
A opção fundamental de Clara é pela pobreza de uma vida privada de garantias, à mercê da generosidade dos concidadãos e dos passantes. O trabalho assume o aspecto de uma das características da opção pela pobreza: Trabalhar para dar e mendigar para viver.
Intitulou-se e às suas irmãs de “Damas pobres”, porque viviam pobremente, com apenas o necessário para o sustento do corpo; pois o espírito era abastecido do alimento mais rico que existia: a oração e a vivência do Evangelho.
Em algumas coisas Clara era mais flexível do que Francisco, como por exemplo, as irmãs podiam ter um convento para morar, já que viviam no claustro. Francisco não queria que os frades tivessem posses, nem casa para morar, – viviam em choupanas. Outra diferença era relativa ao dinheiro, pois Francisco dizia que os irmãos deveriam trabalhar pelo seu sustento, sem receber dinheiro. Já Clara permitia o uso do dinheiro, não para uso próprio, mas para doá-lo aos mais necessitados. As irmãs deveriam viver pobres como o Cristo pobre.
Clara fundou uma fraternidade em que todas as irmãs eram constantemente, consultadas até às mais humildezinhas, pois dizia que todas tinham alguma contribuição para dar.
Tinha como lei suprema a caridade, da qual a necessidade é a base. Contrapõe ao poder, o serviço, pois quem mais recebe, deve dar mais no esforço de ir ao encontro às necessidades dos outros, em todos os níveis e campos da vida humana.
Para Clara a paz é anunciada e vivida a partir da cruz e é através dessa vivência do Cristo pobre e crucificado que ela encontrou a paz e a espalhou através do seu sofrimento, pois mesmo doente, durante 29 anos, nunca deixou de trabalhar e demonstrar alegria em servir.
Clara foi radical na pobreza, na contemplação e na caridade, mas acima de tudo extremamente dócil e livre. Foi também a grande conselheira de Francisco. É muito difícil falar de franciscanismo sem citar Clara de Assis. Se Francisco foi o pai da Ordem, Clara foi mãe e tão intensamente, que sua própria mãe, ao enviuvar tornou-se clarissa e sua filha.
A mensagem que Clara e Francisco nos deixam, hoje, é de humildade em reconhecer no outro alguém como nós, com os mesmos problemas, as mesmas necessidades e indiferentemente de classe social, com o mesmo potencial de trabalho e realização.
Francisco e Clara viveram no seu tempo algo extremamente novo, porque contemplaram Deus no irmão que sofre, que passa fome, que é doente, que precisa de carinho e atenção.
A vida hoje em dia, tão atribulada não nos permite enxergar no outro alguém que tem necessidade de ser ouvido e amado. Quem sabe, nós possamos, como Clara e Francisco, abdicar do nosso luxo, que é o comodismo de dizer que não temos tempo, para dedicarmos um pouquinho dessa riqueza para quem não a tem, mesmo que isso consista apenas em parar para ouvir o que o irmão precisa falar.
“Que o Senhor esteja contigo e que tu estejas com ele, também”.